segunda-feira, 15 de junho de 2015

ANIMALIA



CABRITA

Gostei do jeito que ele entrou varrendo o ambiente com visada larga, sentou na primeira vaga, pendurou o chapéu na ripa da cadeira, pediu uma cerveja sem extravagar no gesto, me pareceu homem decente. Tem uns que chegam com panca de bacana, sabe aquele cara que olha por cima fazendo pouco caso, chega aqui atrás de puta mas morre de medo de puta, acha que é raça baixa, perigosa? Pois é, conheço o tipo, gosta de mostrar que tem dinheiro e se acha no direito de ser rude com mulher de zona, tratar no solavanco, despejar nota de cem na cara da gente com raiva de livrar a grana suja que ganhou deus sabe como. A gente atura pela paga, tenta escapulir, mas a regra da casa é clara: freguês não pode ficar sozinho na mesa por mais de dez minutos, tempo suficiente para tomar fôlego no salão de dança. Aí vale o rodízio e a menina da vez tem que se chegar com um chamego, uma conversa de boavinda. A maioria pensa que a gente só gosta de grana e pica, muito de vez em quando rola uma conversa boa que faz a noite mais macia. De pau a gente até enjoa, é fartura toda noite, fazer o quê? Profissão é profissão e atrás dela vem dinheiro, não dá pra recusar por bobice de capricho. A gente atura.
Ele não. Tinha o dom da simpatia, um sereno que chamou a atenção da mulherada. Lurdinha quis tomar a dianteira mas era minha vez, espetei nela o osso do cotovelo e abordei a mesa do elegante com jeito e simpatia. Que dama não gosta que o cavalheiro se levante e puxe a cadeira para ela sentar? De cara já ganhou ponto comigo. Começou a desfiar uma conversa rasa, clara de entender, era viajante, estava cansado de estrada, fazia três meses que não via a família, estava passando ali por um acaso, viu a luzinha roxa e resolveu buscar conforto em colo de dama.
Fez questão de falar do seu respeito pela nossa profissão, utilidade pública, ele falou, esse negócio de ofertar prazer e companhia a um sujeito desprovido de assistência, cansado de sem ninguém, carente longe dos seus. Tinha uma voz dengosa e falava me olhando bem na cara, coisa rara, pois a maioria não olha no olho da gente. Não avançou, não meteu a mão nas minhas coxas, me carinhava só com o jeito de falar. Para esse eu dou de graça, só cobro a taxa da casa, vê se pode, esquecer que é puta e fazer de conta que é moça de família, me deu esse sentido, quem milita sabe quanto vale a prenda.
Caiu ficha na maquininha e a voz de Altemar Dutra cobriu a dele: veja só que tolice nós dois brigarmos tanto assim. Ouviu calado, de vez em quando fechava os olhinhos de saudade, me deu vontade de passar a mão nos cabelos dele mas parei no meio da intenção, tive pudor, e olha que pudor de puta é coisa séria, comichão de amor amigo periga virar paixão. Aí ele chamou para dançar, enrolou meu corpo com firmeza, encostou seu rosto e me deixei levar no passo dele, dava pra sentir a inveja das meninas e um grosso cutucando meu desejo lá em baixo. Ficamos assim abraçadinhos três boleros, num bate-coxa tesudo, muito melhor que trepada. Era tudo o que eu queria. Rezei a deus para retardar a hora do consumo, adiar o rito de subir ao quarto para extrair o carnegão, me deu o luxo de não me entregar muito fácil logo assim no primeiro encontro, coração de puta às vezes finge que amolece.
E ele teve a sensibilidade de compreender a minha condição. Levantou da mesa, arranhou os meus cabelos com a ponta dos dedos, pegou a mão da Lurdinha e subiu a escada com ela para o quarto. Nem passaram vinte minutos e os dois voltavam ao salão, ele com um sorriso de satisfação que lhe dava um tom meio palhaço no rosto moreno. Pagou a conta e foi embora sem me dar adeus. Antenor, o nome dele.
  



AMOR DE PACA


Tá certo que o Ademar me pegou numa hora de fraqueza, sentindo falta de homem no meu canto. Foi chegando de mansinho, sem forçar a barra, até que um dia seu olhar brilhou no meu e senti a fome dele crescendo pra cima de mim, desesperado de explorar a minha gruta. Fazer o quê? Perdi a pose. No meu lugar você faria a mesma coisa, minha filha, o cara é bom de serviço e hoje em dia competência é artigo raro, você sabe muito bem, lembra aquele bonitinho que te gorou por falta de poder? Pois é. Acabei dando mole e quando vi já era tarde, estava de paixão com o cafajeste, pior: dependendo dele pra ser feliz. Uma coisa é um romancezinho para enganar inocente, gozar são outros quinhentos. E eu gozo demais com o Ademar, o safado tem a manha de me deixar de quatro. Sabe a que horas ele gosta de me procurar? Você não vai acreditar: cinco de manhã. Bate a campainha lá em casa todo dia de madrugada, diz que gosta de pegar a paca quente no ninho, uma tara dele, sei lá. Fazer o quê, tive que me sujeitar ao serviço dele, uma, duas, três vezes com pouca folga entre uma e outra, depois ele toma uma chuveirada, eu sirvo um cafezinho na cama e às 8 e meia ele já saiu para o trampo, me deixando bem disposta para enfrentar o dia. Virou meu vício, minha ginástica matinal. O que ele faz na vida? Sei lá, diz que é corretor imobiliário, não quero nem saber, para mim ele é o meu trepador profissional, o bombeiro que vem desentupir o meu encanamento, meu rotorruter, vale por dez sessões de análise. Por falar nisso nunca mais procurei o Dr. Edvaldo, joguei fora o meu rivotril, ando com a cabeça boa, a enxaqueca sumiu. Recomendo o tratamento, Marinalva, é uma maravilha! O quê? Te emprestar meu Ademar? Que é isso, minha filha? Vai à luta! Esse é só meu, ninguém tasca, é meu mucamo e meu feitor, faz de mim o que quiser. E daí? É claro que eu pago bem. Ele nunca exigiu, tem a delicadeza de pedir emprestado, diz que vai pagar assim que possa. Não faço questão, dinheiro serve pra quê? Graças a deus a pensão que recebo do falecido dá e sobra. Ai, meu deus, quanto tempo eu perdi gastando com esses pacotes turísticos da CVC sem saber que a felicidade pode bater na minha porta todo dia de manhã e me levar ao país das maravilhas, sem museu e sem igreja para visitar, sem queimadura de praia, aquele cheiro horrível de hotel 3 estrelas. Ficando doida, eu? Ai, Marinalva, você não sabe o que é bom. Olha aqui, minha filha, já são 11 horas, vou dormir, tenho que ficar prontinha pro meu Ademar, daqui a pouco ele chega. Me liga na hora do almoço, tá bom? Preciso comprar um terno novo para ele no shopping, você me ajuda a escolher? Confio no seu bom gosto, só pra arrumar macho é que não tem funcionado muito bem, não é minha filha? Tchau, tchau.





CADELA


Quis viver com ele para sempre e ele me disse: fica à vontade e vai embora quando for a hora. Quis morrer com ele e ele falou: agora é cinza, meu tempo de morrer já é passado. Tentei encontrar uma palavra justa e não achei. Fiquei perdida ao redor dele, cega de luz, tonta de tanto querer. Nunca me senti tão perto de um estranho. Somente a ele ousei pronunciar a fórmula banal, te amo, e ele não me acreditou. Traçou um diagrama para elucidar o meu amor patético. O buraco é mais em baixo, ele me disse, amar são outros quinhentos. Propus fechar contrato de seis meses com cláusula de prorrogação, mas o tempo foi para o espaço. Deu em nada. O que sobrou? Selar e congelar a carne para o próximo banquete, que já está disposto a qualquer outro cão que saiba me cheirar com jeito. 




OLHOS DE VACA


Existe muito pouca diferença entre os olhos da vaca que eu conheci na fazenda do meu tio e os olhos de Percília. Ambos falam de uma tristeza resignada a uma sina que não ousam confrontar, como se não tivessem a mínima chance de mudar o rumo das coisas que notoriamente não agrada a nenhuma das duas. Os de Percilia revelam uma melancolia mais acentuada pelo traço da boca crispada para o chão, talvez pelo fato de muito procurar sem achar jeito de escapar ao seu destino, o que lhe deu pela vida afora a triste fama de queixosa. A vaca que eu conheci na fazenda do meu tio também me parecia sem a mínima noção do que fazer para evitar sua ruína, mas sustentava uma postura digna em sua ruminação silenciosa, sempre me deu a impressão de estagiar um rito de preparação, como se já previsse a sua vez de deixar-se conduzir resignadamente à trilha do matadouro, e nem por isso cabia qualquer queixa, aquele era o seu destino traçado. No mais são iguais, os olhos de Percília e os olhos da vaca. E fui me apaixonar logo pela Percília. A vaca da fazenda do meu tio foi apenas um lampejo de admiração, desconfio que teria sido mais feliz com ela mas dessas coisas a gente nunca pode ter certeza absoluta.




A LEBRE LOUCA


Cada canto desta casa lembra Elisa, seu cheiro de sabonete de rosas, seu vestido branco batendo feito bandeira ao vento, seus cabelos molhados, o jeito de se aprontar rapidinho e jogar um beijo pela greta da porta, um vendaval e depois dele um nada imenso cheio da ausência de Elisa, sentir saudades era o tempo certo da evaporação, como se abrisse de repente o túmulo milenar de um faraó, a imagem de Elisa se esvaindo em contato com o puro ar de sua não presença, para meu pavor e desconsolo, ela sumia e eu tentava resgatar seu rosto em minha mente, recuperar seus traços e seu movimento e nada, ela só existia mesmo era de corpo presente, eu ficava olhando a fumaça do meu cigarro, não conseguia perceber sequer a poeira no rastro da lebre louca, imperceptível como um chicote cinematográfico, minha pobre química ótica incapaz de registrar na retina a passagem meteórica de Elisa pelo espaço da minha vida, um quadro matinal de céu azul na janela do meu quarto, tudo tão bonito e eu desencantado por esse zumbi sem alma, sabia que ia demorar uma nova encarnação de Elisa na minha frente, um ano talvez, talvez uma vida inteira.



GAZELA


Era a fêmea talhada para o meu apetite. Armei o bote, tracei o cerco, azeitei as armas e me pus à espreita da hora propícia. Não tinha pressa. O caçador exímio não se contenta com alvos fáceis. Seu código de ética não lhe faculta agredir a inocência dos descuidados. Antes de arremeter contra a presa, o predador obriga-se a produzir um sinal de alerta. A arte da caça manda provocar o pânico, pressentir o rito da escapada, gozar o teso muscular do alvo que se esquiva. É esse o gozo, aí mora a delícia. Alvejar pelas costas, sem o susto da premonição, fere o mais elementar preceito da perseguição. Negar à caça a chance de fuga ou retaliação é ato indigno do caçador ético. Fiz tudo certo, conforme o manual, mas ela me feriu bem aqui no coração, caiu no mato, me escapou. Perdi o gosto, aposentei as armas, já não caço.
  



TIGRESA

Tudo bem que sua boceta acolha meu pau de modo tão especial que mesmo não se pertencendo propiciem uma rara comunhão de bens sem queixas proprietárias nem demanda de direitos autorais. Tudo bem que esse encaixe seja funcional ao ponto de ofuscar nossos defeitos de fabricação, deixá-los passar ao largo dos critérios, deletar incertas marcas que nos vão deixando um certo dissabor em relação a tudo o que não diz respeito a essa boceta e a esse pau que não são nossos, são de quem quiser, de quem souber deles tirar um caldo honesto e generoso, pois somos assim, cães sem donos, sem noção de quem vai nos merecer e mesmo assim expondo nosso dote em praça pública, nosso odor exótico colocado à prova dos olfatos mais vorazes, atraindo mais loucura para o nosso tédio, mais delírio para a nossa cisma de espantar o medo que sentimos um do outro e quem sabe um dia conceber a estranheza desse nosso amor e poder curar o espaço onde ele faz sentido, único lugar onde, a duras penas e dulcíssimos prazeres, ele existe.



CAMALEOA


Sempre fui solteira, me dou bem na condição. Vontade de casar sinceramente nunca me assaltou. Gosto de escolher o meu macho da hora e dar pra ele em temporada exclusiva, só pra ele, até que ele desgoste de mim. Raramente desisto de um biscate que me serve em cortesia. Tanto treino nessa mira, quando vejo um tipo que me calha ponho todo o meu empenho na empreitada. Não misturo, disso faço questão. Dou tudo o que tenho para o cara da vez até ele deixar de merecer os meus cuidados. Nem por isso pense que essa minha vida é fácil. Sei que amanhã tudo pode virar poeira, mas anda comigo a fé em deus e a esperança de que todos os meus amores durem pela vida inteira. Querer é pecado?






CANIBALIA

Comprei aquele jogo de facas ginsu que há muito tempo namoravas para te dar de presente no dia do teu aniversário. Planejo após a nossa ceia passar no fio do aço a tua carne apreciável, retalhar teu corpo em pedacinhos para multiplicar os teus encantos, congelar e te incluir no meu cardápio quaresmal, a começar por teus dedinhos marinados ao cominho e açafrão, a terminar por teus miolos moqueados ao limão, sorver teu sumo, teu hormônio, tua enzima, toda a tua essência enfim passada em minhas tripas e celebrada no altar do meu prazer, me tornar enfim teu dono e proprietário para eterno gozo meu e alegria.  




A HORA DA LOBA
Apud Neil Jordan


Quando ela me abraçou senti a dureza dos seus ossos sob a pele e não pude deixar de pensar no viço daquele corpo de trinta anos atrás, cheio de carne e sangue latejante que eu sugava com furor adolescente. Ela também gostava de me pegar, me usava com proveito, sabia tirar prazer de mim. Agora estava ali como um balão vazio entre meus braços, demorou o rosto colado no meu, me apertou com força, me beijou.
- Câncer, soprou no meu ouvido sem que eu perguntasse nada, perdi doze quilos em três meses.
- Finalmente você conseguiu, respondi meio sem jeito, e nem precisou fechar a boca.
Zamira sempre teve gana de traçar deus e todo mundo. Não era gula, era uma vontade de comer, um apetite voraz que marcava sua fama no território. A turma se divertia em vê-la diante de um prato de comida, manejando os talheres como operária de fábrica, lambendo os beiços, estalando a língua, ronronando de prazer. A mesma sanha que espantava os homens que ela cismava de caçar em suas noites de loba. Não qualquer um, é bom que se diga. Fazia questão de escolher a dedo, observava, conversava, selecionava com critério e só partia para cima quando tomava opinião. Caçava o suficiente para matar a fome, não seduzia para colecionar. Poucos resistiam ao encanto de sua beleza estranha, uma mulher à frente do seu tempo, nem aí para os tabus da burguesia, livre e dona do seu querer. Nunca foi vulgar, vestia-se com elegância simples, tinha a manha de conduzir seu corpo com graça, olhava nos olhos da gente, não sabia fingir, falava claro o que tinha que falar.  
Vinte anos se passaram e a distância não tinha dissipado a presença de Zamira em minha vida. Vivia pensando nela, quantas vezes me sucedia indagar o que ela faria em meu lugar antes de tomar uma decisão, talvez porque só com ela me tinha sucedido a delicada experiência dos amantes que não querem pertencer um ao outro. Um belo dia partiu para Barcelona sem dizer adeus, perdemos o contato. De volta ao Brasil depois de longa temporada, ela telefonou marcando encontro e agora estamos aqui na calçada em frente ao teatro da imprensa, enlaçados num abraço terno, olhando-nos com certa estranheza e alguma intimidade que nossa história comum ainda nos concede apesar de tanto tempo separados. Eu tinha sugerido assistirmos a uma nova montagem de Molière, ela vacilou – Tartufo, de novo? Não é melhor tomar um vinho e conversar? Claro que era, dobramos a esquina e entramos no Saloon, velho ponto de encontro da turma, à la recherche.
Mesmo doente ela não tinha perdido a chispa, aquele jeito de agitar os braços e jogar os cabelos para trás para zombar dos viventes sem imaginação, a mesma energia solta. Ainda era possível perceber o brilho em seu olhar por trás do véu que começava a embaçar a fonte original. O rosto descarnado projetava seus dentes branquíssimos para fora da boca miúda. Falou da sua vida em Barcelona, de uma solidão incompatível com seu jeito fácil de fazer amigos, da sua tormenta por não conseguir aculturar os machos da Catalunha e acomodá-los ao seu gosto de comer, sua inaptidão para firmar contratos de acasalamento, mencionou alguns romances sem consequência e, só para me deixar chocado, anunciou sua decisão de descansar da luta e viver em castidade.
Conta outra, debochei, você não conseguiria. Mas ela acabou me convencendo: três anos sem macho, acredite se quiser! E olha que não me fez falta por lá, só agora no Brasil é que voltou aquele comichão de caça, mas aí adoeci e o desejo ficou no limbo. Senti uma ternura imensa por ela, peguei a sua mão, fiz um carinho com a ponta dos dedos sobre os seus cabelos ralos, enfraquecidos pela quimioterapia. Ela se esquivou, pedimos mais um vinho.
Carcinoma de colo de útero. O ninho da maternidade injuriado por células que insistem em reproduzir-se sem controle. Tentou associar sua renúncia ao sexo, sua falta de vontade, à doença sorrateira. Por um breve momento chegou a perder a compostura e deixou escapar a queixa: por que logo eu? Você e mais alguns milhões de mulheres com câncer de útero – respondi sem intenção de consolar – você e outros milhões de homens com câncer de próstata. Não há eleitos, o acaso decide, com ajuda da sua herança genética, seus hábitos de consumo e sua capacidade de lidar com a angústia de viver. Mais cedo ou mais tarde todos nós adoecemos e isso é que é difícil admitir, que também somos frutos que maduram, caem do pé e apodrecem.
Zamira ficou um tempo em silêncio, olhos fixos nos meus, um sorriso suave nos lábios. Tem razão, disse, somos passageiros nesse trem, mas não pense que estou amargando por querer amargar, é que essa coisa traz disfunções, os hormônios se alteram, o tratamento é violento, a gente acaba perdendo o prumo. Caí na mão do sistema de saúde, me entreguei completamente, só agora consegui recuperar a autoridade e já decidi: não faço mais radio nem quimioterapia. Vou deixar rolar até o fim, só não posso esquecer de carregar na bolsa umas drogas para amenizar a dor que é danada. Se estou rumando para o fim vou tratar de fazer isso com dignidade, a céu aberto, e não na prisão dos hospitais, até a última força que me sobrar. Sabia que a Bélgica recebe hoje um grande fluxo de turistas, doentes terminais sem esperança de cura, em busca de uma morte misericordiosa? Lá a eutanásia é legalizada.
Achei que devia interromper: tudo bem, mas antes de tomar o rumo da Bélgica e o caminho da morte, proponho uma trilha alternativa: vamos lá pra casa, levamos mais um vinho, faço um jantar para nós, vemos um filme, você dorme por lá, acordamos amanhã e vamos matando a saudade com calma. Não vai ser num único encontro que vamos dar conta desse vácuo. Você já me contou quase tudo, como se essa noite fosse terminar em dois beijinhos e até daqui a mais trinta anos, meu bem. Temos tempo, e além do mais hoje não é um bom dia para morrer.



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